Entre versos e assobios, a entrevista com o poeta Zininho
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Zininho nos recebeu com simpatia, mesmo sem ter planejado visitas naquele sábado. Estava na casa de um amigo em Sambaqui, bairro a 30 Km do centro de Florianópolis. Cercado por 40 anos de memória das rádios da cidade, deixou o acervo de lado para uma conversa que se estendeu até o fim do dia.
Lançado há algumas semanas, o PalavraMundo voltou à região onde conheceu Reinaldo, o arqueólogo mirim da ilha de Ratones Grande. E a busca agora seria ainda mais difícil, pensávamos. Claudio Alvim Barbosa, com 61 anos à época, não tinha planos de virar notícia.
Os amigos que deixamos na primeira aventura de reportagem nos ajudaram de novo. E a equipe do jornal cresceu: três repórteres mirins nos acompanhavam. Descobrimos o endereço onde Zininho vivia, perguntando pela rua.
E a ecologia?
Estou vivendo entre os assustados.
Assustados com o quê?
Com a Ponta do Sambaqui. Eles têm a Beira-Mar lá que só está servindo para os coconautas, né? E querem trazer a marina pra cá! Isso é uma agressão.
Estávamos no meio da manhã de um dia ensolarado no distante novembro de 1990. A janela do quarto onde Zininho mergulhava nas pesquisas do acervo dava para a rua. Graças ao clima, a vimos aberta. Bastou reconhecê-lo e as repórteres mirins se anteciparam.
Imerso no trabalho de recuperar a memória sonora da cidade, Zininho tirou os fones assim que percebeu a presença das meninas, já no quintal. Cristina, Kenia e Maristela, de cara, tiraram um sorriso do poeta que imortalizou o hino de Florianópolis.
Não foi uma entrevista clássica. Sentamos à mesa em um bar na esquina da casa onde o encontramos. Gravador ligado, Zininho ensaiou versos e respondeu a perguntas que, de tão singelas, pediam respostas difíceis.
Como é ser poeta?
Nem eu sei. A gente não é porque quer. Não tem hora, não tem dia, não tem momento. A inspiração vem em você. É só ver que eu não toco nenhum instrumento e quando a inspiração aparece eu já faço letra e música. Tudo junto.
Qual foi a melhor poesia que você fez até hoje?
Foram tantas que nem eu sei te dizer. Eu poderia parar pra pensar um pouquinho qual foi a menos pior (risos). Mas eu faço muito rabisco e jogo fora. Eu estou aqui (em Sambaqui) há sete meses. Agora, depois desses anos todos, é que eu estou começando a me motivar.
Aprendemos rápido o que significavam os assobios corriqueiros ao longo da entrevista. Era uma forma de evidenciar a inspiração. Enquanto assobiava, Zininho parava, olhava a esmo como se estivesse em outra dimensão. De vez em quando rabiscava em um guardanapo.
O cenário, na verdade, ajudava. Curiosas, as repórteres mirins faziam perguntas típicas de criança. Ninguém estava interessado em tirar manchetes daquela conversa. À mesa, entre uma cerveja e outra, os “adultos” curtiam o papo. Zininho estava em casa.
E a ecologia?
Estou vivendo entre os assustados.
Assustados com o quê?
Com a Ponta do Sambaqui. Eles têm a Beira-Mar lá que só está servindo para os coconautas, né? E querem trazer a marina pra cá! Isso é uma agressão.
Gravamos umas cinco fitas cassete, cerca de cinco horas de conversa. Já era final de tarde quando nos despedimos de Zininho. A entrevista foi publicada na contra-capa do jornal, mais uma matéria na página anterior.
Tínhamos reservado a contra-capa para as entrevistas. Mas o tanto de material que conseguimos pedia algumas edições inteiras só para ele. Guardamos tão bem a gravação que não a achamos mais. Uma perda até hoje sentida. Poderia estar no acervo que Zininho tão bem cultivava.
E a lua se espelha na Lagoa mesmo?
Vocês nunca viram? Lá tem duas luas, uma em cima e outra lá embaixo.
E a Figueira?
Tadinha… Tá de bengala. Outro dia passei na Praça XV e quase tive um troço. Botaram barracas embaixo da Figueira. Que falta de respeito!
A empresa que protagonizou o PalavraMundo, a Facto Comunicação, não vingou. Éramos onze sócios. Os fragmentos de toda a produção em diferentes frentes de trabalho não foram reunidos e o tempo encarregou-se de apagar as trilhas até eles.
Zininho tem a obra e aquele trabalho que ele fazia quando o interrompemos, no entanto, preservados. Em 2018, uma exposição organizada pela filha Claudia Barbosa lembrou os 20 anos sem aqueles assobios inspiradores e os rabiscos criativos.
Algumas dicas para conhecer a obra do poeta
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